terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Após dois anos sem escrever voltei... Este meu regresso à escrita coincide com o meu regresso às origens. Voltei à ilha Terceira, nos Açores, no passado mês de Dezembro. Cada vez mais tenho a certeza que o ser humano é feito para estar em comunhão/harmonia com a natureza. Só assim consegui refletir sobre este tema e voltar a ter vontade de passar para o ecrã os meus pensamentos, mais ou menos desconexos sobre assuntos do quotidiano da alma e do mundo.
 
Sobre as Viagens Contemplativas

O ato de contemplar pode ser interpretado como ação de preguiçoso, ação em que não se investe energia, ação zero, ação em que não move músculo, ação de olhos. Contemplação como ofício de nada a alterar. O ofício de esperar
E no entanto, como explica, por exemplo, Heidegger, para os gregos contemplari significa “separar e dividir uma coisa num sector e aí cercá-lo e circundá-la”. Em primeiro lugar, contemplar é pois, selecionar uma parte do todo, é destacar algo, é fazê-lo brilhar, ou melhor: é ver o seu brilho – é “partir e separar”.
Mas o interessante é relacionar essa palavra com a latina templum que significa, uma parte “que se recorta do céu e da terra". é dentro dessa zona ou região recortada que os profetas "realizam a sua observações para saber o futuro pelo modo de votar, gritar e comer pássaros".
Contemplar é, portanto, recortar uma parte do mundo, da terra e do céu, mas não uma parte do undo qualquer - é selecionar a parte do mundo que no pode ensinar, que nos pode dar indícios sobre o futuro.
Contemplar é estar pois com o tempo, é fazer de uma parte do mundo o nosso templo, o lugar que nos faz pensar e perceber o futuro.
Não era, portanto, por acaso que os antigos gregos colocavam a vida contemplativa muito acima da vida ativa. Só os ábios contemplavam - pois não se trata, então, de olhar e dar atenção a um pormenor do mundo, trata-se de escolher a parte do céu que nos eleva, a parte da terra que não nos deixa cair; trata-se de escolher o homem ou a mulher que nos pode salvar, o objeto que pode fazer mexer, decisivamente a nossas mãos.
Contemplar é fazer templos; é ser digno de fazer, de um quadro, um templo; é ter um olhar suficientemente denso e profundo para fazer, daquilo que se observa algo sagrado; algo que jamais conseguiremos esquecer. Pois é isso, que no fundo, é o sagrado: aquilo que jamais conseguirei esquecer, o benigno inolvidável. Sagrado é aquilo que só esquecemos quando perdes a Humanidade, e humano é aquele que jamais esquece o que é sagrado.
A memória, de um ponto de vista mais geral, pode não ser considerada uma faculdade nobre, alta, divina - esquecer um número de telefone, por exemplo, não parece ser uma brecha na nossa ética. Agora, esquecer o que se contemplou, esquecer aquilo que se elegeu e separou do resto do mundo, aquilo que nos fez prever o futuro, esquecer isso, é esquecer, precisamente, não o passado, ma o que aí vem. Alguém que perde a memória perdendo o futuro perde o mais valioso: a bússola, a orientação, o sentido. Não se trata de perder a lembrança de acontecimentos do passado; esquecer o que um dia se contemplou e esquecer o voo e o ruído da ave que tornou claro o caminho que temos de tomar no dia seguintes, Contemplar é, poi, trabalhar, o futuro, aprendizagem do que aí vem. Preparar-me intelectualmente para os dias seguintes, eis o que é contemplar.

E na viagem, sim, por vezes conseguimos contemplar: encontrar o bocado de terra ou de céu que torna ais claro o caminho dos anos seguintes,


3 comentários:

  1. Ola Carla, sou o Miguel, conhecemo-nos em circunstancias estranhas ha uns anos. Só para dizer que gostei muito do teu post e que estou de acordo contigo e com os sabios. Espero que a tua volta a terceira tenha sido voluntaria e que encontres um cauce interessante para a Historia da Arte na terceira. Vi que tinhas actividades no museu de Angra... estas a cargo de algo? Um saludo e espero mais publicaçoes contemplativas ou nao... :)
    Miguel

    ResponderEliminar
  2. Olá Miguel,
    Espero que esteja tudo bem contigo aí por Barcelona e com os Restauros (uma outra grande paixão minha).
    Obrigado pelas palavras.
    Neste momento estou a fazer o Estagiar L no Museu de Angra, na parte dos Serviços Educativos.
    O regresso foi mais que voluntário, fartei-me da metrópole :P
    Tudo de bom.
    Keep in touch.
    Beijinhos

    ResponderEliminar